Eu
não sou aquela que escreve rascunhos, no final das contas. Tão pouco sou dona das verdades enraizadas nos livros.
Sou pobre, e isso é um fato; não mantenho vivas as ambições de que dependo. Passo apenas, como o dia que passa ao ceder lugar à noite, nessa falsa linearidade que é o tempo. Anseio, mas é desejo breve e por isso, acabo jogada no canto de ser eu, nos buracos da representação que me cabe menos e, entretanto, são as que mais agradam.
- Melancólica!
Ouço a palavra fluir dos meus lábios e sinto que é real. Vejo o Sol dourar a minha pele como agora, nesse fim de tarde do cerrado, e sinto que é real.
As casas desbotadas, a mesa de concreto sobre a qual escrevo no caderno de costume, as formigas caminhando enfileiradas e as crianças brincando no parquinho, eu sei, é real.
Só que eu não sou! Apenas eu não sou! Eu não estou aqui, eu não existo, não há matéria.
São 6 horas e 34 minutos em Brasília e o Sol ainda alto com o verão que tarda em acabar; mudo o lugar, arrumo o corpo e me dou às sombras. Mas nada em mim pode ser! Eu não habito aqui...
E entendo, aos poucos, como outro estar não me proporcionaria este momento, como nenhuma outra árvore seria tão graciosa e jocosa quanto a que derrama suas folhas em meu cabelo.
E mesmo assim continuo não estando, continuo sem essência; continuo recebendo os beijos alegres do vento sem poder lhe dar nada em troca.
Porque eu não tenho nada para dar, eu não possuo...
Sacio-me, pois, da inexistência do que é belo e doce: as lembranças da infância onde eu era mais mulher do que agora – do tempo em que eu existia.
O real caminho que trilha a minha voz; o mesmo caminho onde eu me perdi.
Para dizer como tenho passado.
Um Beijo.